Um dia após aprovar o projeto que reduz as penas dos condenados por tentativa de golpe de Estado, entre eles Jair Bolsonaro, a Câmara dos Deputados decidiu, nesta quarta-feira (10), desafiar abertamente o Supremo Tribunal Federal (STF) e preservar o mandato da bolsonarista Carla Zambelli (PL-SP), mesmo após sua condenação definitiva a dez anos de prisão por comandar a invasão hacker aos sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A decisão ocorre enquanto a deputada segue presa na Itália, depois de fugir do Brasil e ser capturada nos arredores de Roma.
O plenário rejeitou a cassação por 227 votos a 170, com 10 abstenções, número insuficiente para alcançar os 257 votos necessários para confirmar a perda do mandato. O resultado contrariou a recomendação da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que horas antes havia aprovado, por 32 votos a 2, o relatório que reconhecia a impossibilidade de Zambelli exercer o cargo por estar presa em regime fechado.
A decisão amplia o impasse entre Legislativo e Judiciário. O STF, que condenou Zambelli por unanimidade na Primeira Turma, determinou a perda imediata do mandato justamente porque a parlamentar está impedida de comparecer às sessões — o que, pela interpretação da Corte, enquadra a situação na perda automática por excesso de faltas. Deputados bolsonaristas, porém, se uniram ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), para aplicar outra leitura constitucional: a de que cabe ao plenário dar a palavra final, mesmo em condenações definitivas.
Logo após a votação, o líder do PT, Lindbergh (RJ), anunciou que o partido recorrerá ao STF.
Para a deputada Lídice da Mata (PSB-BA), mesmo com o resultado, a permanência de Zambelli no cargo é inviável. “Na prática, ela já está cassada”, afirmou, lembrando que o regime fechado impossibilita o exercício do mandato e inevitavelmente levará à perda por faltas.
Bolsonarismo fecha fileiras por Zambelli
Nos bastidores, pesou o corporativismo de deputados temerosos de abrir precedente contra colegas envolvidos em investigações, muitos deles também aliados de Bolsonaro. Zambelli foi defendida em plenário por parlamentares que repetiram a tese bolsonarista de perseguição judicial.
Durante a sessão, seu advogado, Fabio Pagnozzi, disse que a deputada pretende renunciar ao cargo mesmo se mantida no mandato. “Zambelli foi muito clara: quando ela ganhasse aqui no plenário, ela pediria a renúncia, porque não quer incomodar seus colegas, ela só quer dignidade”, declarou. Ele ainda afirmou: “Ela não cometeu e nem ordenou invasão ao CNJ. […] A única prova que eles julgam ser prova é o depoimento de um hacker”.
Condenada, presa e à espera da extradição
Zambelli fugiu do Brasil após a condenação definitiva, passando por Argentina e Estados Unidos antes de desembarcar na Itália. Foi presa em julho e é mantida em penitenciária ao norte de Roma, com risco de fuga considerado elevado pela Justiça local. Seu processo de extradição foi adiado novamente após a defesa apresentar um volumoso conjunto de documentos — uma manobra que pode prolongar ainda mais sua permanência atrás das grades e que será analisada em nova audiência marcada para 18 de dezembro.
Enquanto isso, o Brasil aguarda que a Corte de Apelações de Roma decida se ela retornará para cumprir a pena.





