A crise provocada pelo coronavírus e a incerteza sobre a extensão e a duração da pandemia tem levado parlamentares a iniciar um movimento em defesa do adiamento das eleições municipais previstas para outubro de 2020.
Estimativas do Ministério da Saúde apontam para aumento dos casos entre abril e junho. A situação só se estabilizaria a partir de julho.
O cenário traçado pelo ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, causou preocupação entre líderes de partidos na Câmara e de congressistas, que temem impacto nas campanhas eleitorais. Elas estão previstas para começar apenas no dia 16 de agosto, mas até lá parte do calendário eleitoral pode ser afetado.
Na terça-feira (17), alguns dirigentes partidários, entre eles o presidente nacional do Solidariedade, Paulinho da Força (SP), debateram a necessidade de achar uma saída jurídica para o caso de a crise se estender até o início das campanhas.
De acordo com o dirigente, se até julho vigorar ainda a restrição para realização de eventos, as convenções partidárias estariam inviabilizadas. Pela lei eleitoral, o prazo para escolha dos candidatos é de 20 de julho até 5 de agosto. Como uma das recomendações do ministério é evitar contato e aglomerações. Isso afetaria também um dos mais tradicionais recursos políticos, o corpo a corpo com eleitores.
Antes que fiquem sem tempo hábil para contornar a situação e cientes de que a lei eleitoral proíbe qualquer mudança de procedimento um ano antes do pleito, congressistas passaram a se articular para verificar a possibilidade legal de adiamento das eleições municipais.
Alguns deles, como o líder do Podemos na Câmara, deputado Léo Moraes (RO), já iniciaram consultas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ele afirmou que a ideia inicial era unificar, em uma proposta de emenda à Constituição (PEC), as eleições municipais de outubro deste ano com as eleições gerais de 2022.
Seria necessário também aguardar que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgasse uma eventual ação declaratória de constitucionalidade, o que enfraqueceria ainda mais a possibilidade de adiamento do pleito.
Em meio a esse impasse, Moraes decidiu protocolar uma consulta ao TSE para pedir que a eleição seja adiada por dois meses e realizada em dezembro. O tribunal deve responder em sete dias. Apesar da discussão na Câmara, um possível adiamento do pleito não está em discussão na cúpula do Senado.
O TSE sinalizou nesta quinta-feira (19) que não deve, por enquanto, mudar o calendário eleitoral. Por unanimidade, o plenário da corte afirmou que não é possível alterar a data-limite para filiação a um partido político mesmo por causa da crise do coronavírus. A decisão da Corte foi em resposta a um questionamento enviado pelo deputado Glaustin Fokus (PSC-GO), que pediu um adiamento do prazo em razão da pandemia.
O ministro do STF Luís Roberto Barroso, que presidirá o TSE a partir de maio, disse que está cedo para discutir mudanças nas eleições:
— Estamos em março. As eleições serão em outubro. Não há razão para se cogitar do seu adiamento. A renovação dos mandatos políticos é um dos ritos mais importantes da democracia e da República. Ninguém gostaria de deixar de observá-lo. Tenho confiança de que até lá a pandemia já terá sido controlada.
A realização de eleições no primeiro domingo de outubro está prevista tanto na Constituição Federal quanto na lei de número 9.504, de 1997. A Constituição prevê ainda o prazo de mandato fixado para cada cargo.
De acordo com membros da Procuradoria-Geral Eleitoral e do próprio TSE, qualquer modificação esbarra na obrigatoriedade de que as regras das eleições sejam alteradas até um ano antes do pleito.
Se na consulta o TSE informar que é possível fazer um adiamento sem violar a lei eleitoral, os congressistas dariam início à segunda etapa, que é verificar o melhor instrumento para a mudança.
Na avaliação de ex-integrantes do TSE, o estado de calamidade decretado pelo governo e o avanço da crise justificariam soluções jurídicas para situações excepcionais, como a eventual necessidade de adiar em alguns meses as eleições.
Nos bastidores, tanto técnicos como ministros do tribunal expressam preocupação com os efeitos da crise no calendário. O receio é que não se consiga cumprir cronogramas básicos. Em abril, por exemplo, é comum um teste de campo das urnas reunindo representantes de todos os tribunais regionais eleitorais. Isso exige viagens e aglomeração, o que seria um desafio.
Fonte: Folhapress